11 de out. de 2011

Flores da Primavera


Todo dia, ou quase todo dia
eu a vejo ali, esperando
sempre ali, cedo, e só
não sei mais de sua vida
só o breve vislumbre
de uma vida
dentre tantas outras
Seu olhar a cada dia
ou quase a cada dia
se põe sempre mais triste
se será pelo dia enfadonho que a espera
ou pela noite sem sonhos que deixa para trás
Seguindo, nas escolas, como presídios
as crianças esperam serem soltas
percalços de infância violentada
canta a canção
ei, professores, deixem as crianças em paz
já foi criança também
e ainda o é
criança ferida e irrealizada
mas ainda é assim
hoje, como ontem
perpetuando castigo por crime algum
As estações seguem seu rumo
mas parece que não a humanidade
como se algo a segurasse ainda
estagnada em suas memórias inventadas
de um sonho de alegria, sempre depois
É primavera
você poderia agora
estar colhendo as flores da primavera
mas não
Sorri, enquanto faz seu trabalho
infeliz trabalho
sustento falho
de alma sempre abortada
do que poderia ser seu sorriso
do que poderia realizar de sonhos
resta apenas
o que se pode sonhar, lembrança
nostalgia
do tempo em que tudo eram possibilidades
e o faz de conta, um brincar de crescer
e ser hoje o que pode ser amanhã
ou que pode jamais ser
pela sua natureza de sonho
mas sonhar mesmo assim
Daí que agora sonham por nós
e nos vendem os sonhos pasteurizados
da casa, carro, casal e filhos
e dinheiro, claro
Desde pequenos
que é de pequeno que se entorta o pepino
e pepinos tortos vemos
crescidos em caricaturas
versões incompletas
sombras
de homens e mulheres
beleza e deslumbre
caminhando sem medo e sem culpa sobre a terra
de crianças de sorriso fácil e mente viva
desabrochando como as flores na primavera
amadurecendo frutos prenhes
soltando as sementes ao fim
que é o começo de novo
simples, só
simples assim



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3 de out. de 2011

Sól


Fulminante, o destruidor
Que não deixou nada que não fosse eu
E tudo era eu
E todo desabei
Só agora sou
Só o que sobrei
Assentado aos pés do que não era meu
E tudo sou eu
O imperador

Fogo, fogo ao meu redor
E não há medo que não seja um véu
Olhei, e era céu
E ali chorei
E estrelas e chuva gerei
Flores e frutos, tão doces quanto mel
Mas nada era meu
Nada era eu
Eu, criador



.

Bate no Peito, História


Persistindo, ainda
E por que não persistiria?
O que os plásticos não sufocam
é o que resta para a derradeira
Mas ainda assim, a trocam
por bela caixa de madeira

Segue, oh tolo imprudente
Que não resta outro caminho
Segue ainda que sozinho
Até que esteja presente

Respirando, ainda
E por que desistiria?
E que não haja perspectiva
que importa fama ou glória?
Pois ainda pulsa, a alternativa
clama no peito a força, história

Segue, oh tolo, e sentes
A sua frente estão caminhos
De ferro, fogo e passarinhos
Pra terra somos sementes

Sonhando, ainda
E por que acordaria?
O que não seja coerente
é que move além do ordinário
Pois, se fecha a corrente
vazia, contém o imaginário


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